sábado, 26 de fevereiro de 2011

A raposa e o principezinho


E foi então que apareceu a raposa:
- Bom dia- disse a raposa.
- Bom dia- respondeu educadamente o pequeno príncipe, que, olhando a sua volta, nada viu.
- Eu estou aqui debaixo da macieira- disse a voz
- Quem és tu?- perguntou o principezinho. Tu és bem bonita...
- Sou uma raposa- disse a raposa.
- Vem brincar comigo- propôs ele. – Estou tão triste...
- Eu não posso brincar contigo- disse a raposa. – Não me cativaram ainda.
- Ah! Desculpe- disse o principezinho.
Mas, após refletir, acrescentou:
- Que quer dizer “cativar”?
- Tu não és daqui- disse a raposa. – Que procuras?
- Procuro os homens – disse a raposa- têm fuzis e caçam. É assustador! Criam galinhas também. É a única coisa que fazem de interessante. Tu procuras galinhas?
- Não- disse o príncipe. – Eu procuro amigos. Que quer dizer “cativar”?
- É algo quase sempre esquecido- disse a raposa. – Significa “criar laços”...
- Criar laços?
- Exatamente- disse a raposa. – Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu também não tens necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo...
- Começo a compreender- disse o pequeno príncipe. - Existe uma flor...eu creio que ela me cativou...
- É possível- disse a raposa. – Vê-se tanta coisa na Terra...
- Oh! Não foi na Terra- disse o principezinho.
(...)
A raposa retomou o seu raciocínio.
- Minha vida é monótona. Eu caço as galinhas e os homens me caçam. Todas as galinhas se parecem e todos os homens se parecem também. E isso me incomoda um pouco. Mas, se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol. Conhecerei um barulhinho de passos que será diferente dos outros. Os outros passos me fazem entrar debaixo da terra. Os teus me chamarão para fora da toca, como se fossem música. E depois, olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim não vale nada. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste! Mas tu tens cabelos dourados. Então será maravilhoso quando me tiveres cativado. O trigo, que é dourado, fará com que eu me lembre de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo...
A raposa calou-se e observou por muito tempo o príncipe:
- Por favor...cativa-me! Disse ela.
(...)
- Que é preciso fazer? – perguntou o pequeno príncipe.
- è preciso ser paciente- respondeu a raposa.- Tu te sentarás primeiro um pouco longe de mim, assim, na relva. Eu te olharei com o canto do olho e tu não dirás nada. A linguagem é uma fonte de mal-entendidos. Mas, cada dia, te sentarás mais perto....
No dia seguinte o principezinho voltou.
- Teria siso melhor se voltasses à mesma hora- disse a raposa.- Se tu vens , por exemplo, às quatro da tarde, desde ás três eu começarei a ser feliz. Às quatro, então, estarei inquieta e agitada: descobrirei o preço da felicidade!Mas se tu vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar meu coração...é preciso que haja um ritual.
- Que é um “ritual”?- perguntou o principezinho.
- É o que faz com que um dia seja diferente dos outros dias, uma hora das outras horas. (...)
Assim, o pequeno príncipe cativou a raposa. Mas quando chegou a hora da partida, a raposa disse:
- Ah! Eu vou chorar!
- A culpa é tua- disse o principezinho.- Eu não queria te fazer mal; mas tu quiseste que eu te cativasse...
- Quis- disse a raposa. (...)
- Então, não terás ganhado nada!
- Terei, sim- disse a raposa- por causa da cor do trigo.
SAINT-EXUPÉRY. Antoine de. O Pequeno Príncipe. Rio de Janeiro: Agir, 2009.



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